Arte, Imagem e Testemunho: O gesto da arte como contramedida - XI Seminário Nacional de Artes e III Seminário Nacional de Fotografia

Por Patricia Schneider 

 Durante o XIV Seminário de Estudos Históricos, XI Seminário Nacional de Artes e III Seminário Nacional de Fotografia, que ocorreu ao longo do mês de setembro de 2019 na Universidade Feevale, em Novo Hamburgo – RS, o professor Me. Rodrigo Montero, doutorando em História, Teoria e Crítica da Arte pela UFRGS, apresentou sua pesquisa sobre vítimas da ditadura argentina e do holocausto.

 Iniciou seu estudo no Instituto de Artes da UFRGS e ano de 2010 apresentou o trabalho: “Da silhueta ao álbum de família: arte e práticas artísticas na construção de memórias da ditadura argentina (IA-UFRGS), tendo como continuidade de sua pesquisa o trabalho apresentado em 2013: “Depois da desaparição: vida, arte e imagem (Argentina 1976 – 2013)” (PPGAVI UFRGS), e em 2016 como resultado de seu percurso de pesquisa temos o trabalho “Projeto de pesquisa Frente a necessidade e a impossibilidade: o gesto artístico como gesto de testemunho.” (PPGAV UFRGS).

 Traz como questão de pesquisa o fato da ausência de provas e documentos desses trágicos eventos. Não há provas, não há testemunhas, não há fotos, não há sequer os corpos. O horror vivenciado pelas vítimas fatais jamais poderá vir à tona, não, ao menos, da forma exata como ocorreu, pois os que chegaram ao final do processo não estão mais aqui para contar e os que sobreviveram não chegaram ao final do processo. Fala do desaparecimento como um meio violento que tortura junto toda a família, a qual não é dada o direito de saber o que ocorreu com um dos seus, restando apenas uma espera dolorosa. Essa espera pode acabar de duas formas, com a soltura da vítima, ou com a constatação ao fim do regime ditatorial que a pessoa não voltará. Fala do desaparecimento causar uma ausência daquele que desapareceu, uma vez que se esse reaparece, se busca um tratamento, um auxílio para aquela vítima, por outro lado, se há a comprovação da morte, a família se despede, e busca-se os meios legais para ressarcir essa família, no entanto, o desaparecimento é um “não ser”, é um não estar nem vivo nem morto, apenas desaparecido. Segundo o pesquisador, Auschwitz, campo de concentração e maior símbolo do holocausto foi planejado para acabar com as provas e fazer com que se acredite que não aconteceu, “não há provas, não há fatos”. Afinal, quem poderia acreditar que algo tão cruel realmente existiu?

  Fala também da dificuldade encontrada pelos sobreviventes, levantando a seguinte problematização: Será que o sobrevivente tem todo o arcabouço simbólico para falar tudo que viveu? Como um sobrevivente poderia descrever as sensações físicas e os transtornos emocionais e psicológicos em palavras cognoscíveis, bem como, de qual forma familiares poderiam expressar a dor de um desaparecimento por meio da linguagem oral ou escrita? Neste viés o professor Rodrigo relata que para os sobreviventes, vítimas da tortura, muitas das vivências eram indizíveis, pois lhes faltavam conceitos anteriores capazes de exprimir o que viveram e, para tentar expressar tamanho sofrimento, alguns dos sobreviventes utilizaram-se da linguagem da Arte.

  Cita David Olère, um sobrevivente que através da linguagem simbólica e sensível da Arte, denuncia as atrocidades vivenciadas no holocausto, por meio de desenhos, pinturas e esculturas que ajudam a revelar a verdade sobre os campos de concentração nazistas. Olère foi designado para trabalhar em uma unidade especial onde era responsável por esvaziar os restos dos fornos do crematório e remover os corpos das câmaras de gás. Afirmou, após sua liberdade, que o que sentiu não pode ser compreendido por quem não vivenciou Auschwitz, é impossível exprimir em palavras os horrores que passou e que testemunhou durante o período. 

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Desenho de David Olère exposto no museu de Auschwitz

  A Arte também serviu de aporte para denunciar a dor sentida parentes próximos de desaparecidos, como o fotógrafo Gustavo Germano, que teve seu irmão preso e desaparecido pela ditadura da Argentina em 1976. Germano criou uma série fotográfica chamada “ausências”, para retratar a dor das famílias que perderam os seus sem ter tido sequer a chance de poder se despedir. 


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