O Pavilhão dos Padres: Dachau 1938-1945 de Guillaume Zeller

Por Patricia Schneider

  A cidade de Dachau na Alemanha, era conhecida no século XIX pela sua beleza e inspiração para artistas, com paisagens naturais deslumbrantes além de uma bela arquitetura e urbanismo. Era também uma importante cidade para o comércio, estando situada no cruzamento de rotas comerciais e a margem do rio Amper. Em 1916 uma fábrica de munições é construída para fornecer armamento para a Primeira Guerra Mundial e é no prédio desta fábrica, desativada depois da derrota do Kaiser, que em 1933 os nazistas inauguram o protótipo de seus campos de concentração. Sendo o centro de Dachau o primeiro centro de detenção inaugurado, tornando-se modelo para os demais campos de concentração.

  A ideologia nacional-socialista pregada por Hitler estava em evidente oposição as leis da Igreja e a perseguição não destinava-se somente aos judeus e sim a todos os religiosos. Os primeiros sacerdotes a serem presos eram poloneses, uma vez que parte da Polônia foi conquistada pelo exército do III Reich. Para dominar o território polonês era necessário destruir para sempre a cultura polonesa, cultura essa que em sua história, arte e literatura estava baseada profundamente nos princípios católicos. Era preciso então destruir a Igreja para destruir a cultura da nação polonesa.

  No início a prisão dos sacerdotes não era centralizada, o que só ocorreu a partir de forte e insistente pressão do Vaticano, ao final de 1940 a polícia alemã cedeu e concordou em reunir todos os religiosos presos até o momento no campo de Dachau, local em que poderiam celebrar missas e expressar sua fé. No entanto, nem todas as exigências do Vaticano foram aceitas, os corpos dos religiosos mortos seriam cremados como todos os outros, e não enterrados como solicitado pela Igreja.

  Frente as atrocidades praticadas pelo nazismo e a perseguição ao clero, que exercia influência política, a Igreja tenta fazer oposição ao III Reich, no entanto, passa a ser vigiada de perto, até o sermão dos padres durante a missa era controlado pela Gestapo, polícia secreta da Alemanha nazista. Um político nazista chega a discursar alegando a incapacidade dos católicos de compreender que Deus está do lado de Fürer. O clero alemão até 1940 era minoria nos campos de concentração, todavia, após tentativas de lutar contra o regime, sofreu sanções e prisões em massa, tornando-se o segundo maior contingente de religiosos presos em Dachau, perdendo apenas para os poloneses. Qualquer oposição era severamente punida.

  Conforme vitória do exército alemão em outros países, mais e mais religiosos chegavam a Dachau, austríacos, tchecos e mais poloneses. Ao todo foram 2.579 sacerdotes, religiosos e seminaristas católicos confinados no campo de Dachau, tendo 1.034 deixado sua vida lá. Os mortos de Dachau eram levados a cidades das redondezas para serem cremados, após sete anos desse esquema, decidem construir seus próprios crematórios em uma instalação a parte. Segundo o padre Goldschmidt “quem não tivesse capacidade de adaptação, talento de organização, zelo, espírito comercial, audácia e também sorte, era um pobre homem fadado a morte no campo de concentração” (2015, pg. 63). Os sacerdotes passavam por uma série de etapas, sofrendo com zombarias e ridicularizações de forma a tirar-lhes o caráter de humanos, a desumanização ocorria nos primeiros momentos após a chegada a Dachau.

  Os sacerdotes foram vítimas de experimentos, espancamentos, assassinatos como quaisquer outros prisioneiros. Dachau foi o único campo de concentração que comportou uma capela e permitiu a expressão da espiritualidade o que não atenuava o sofrimento e o terror vivenciados pelos religiosos. Zeller realiza uma vasta pesquisa e apresenta dados históricos ao longo de todo o texto, por ser jornalista, traz esse caráter de informação datata e contextualizada em sua obra.

  O livro é divido em três parte, na primeiro relata como os padres foram sendo presos e como foi feita a centralização dessas prisões em um único pavilhão, na segunda parte o autor fala sobre a fome, as doenças, o ódio dos nazistas aos cristãos, as experiências médicas e as mortes e na terceira ele foca em mostrar a capela e a vida sacramental dentro do campo de concentração e a libertação das vítimas em abril de 1945.O Pavilhão dos Padres pode ser visto como um memorial às vítimas religiosas do nazismo, e um documento que dá luz a uma história pouco conhecida e evidenciada do holocausto.

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